Os médicos devem nortear suas decisões à luz da ciência, sem se deixar influenciar por viés político, diz a presidente da Sociedade Baiana de Infectologia (SBI), Miralba Freire, ao afirmar nesta quarta-feira (20) que a entidade não recomendará a prescrição de cloroquina e hidroxicloroquina para todos os pacientes diagnosticados com o novo coronavírus.
Na terça (19), o Ministério da Saúde divulgou um protocolo em que amplia a possibilidade de uso dos dois medicamentos também para pacientes com casos leves de Covid-19. A nova diretriz, destinada a hospitais da rede pública, sugere a combinação de cloroquina ou hidroxicloroquina com azitromicina.
“A nossa posição é de não recomendar o uso desses medicamentos para todo mundo, obviamente, por serem tratamentos que estão em estudo. Como são de drogas conhecidas, licenciadas, os médicos têm a possibilidade de prescrevê-las. Mas isso só é feito dentro de protocolos, avaliações de risco e se houver consentimento do paciente ou responsável. É preciso muita calma nessa hora”, declarou Freire.
Ela diz que, na prática, o protocolo do governo federal não mudará os critérios adotados pelos profissionais de saúde para a administração dos medicamentos, uma vez que ambos não têm eficácia comprovada no tratamento do coronavírus.
O uso das substâncias é defendido pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e foi o principal ponto de divergência com o ex-ministro da Saúde Nelson Teich, que deixou o cargo na semana passada. A pasta está sob o comando interino do general Eduardo Pazuello.
Prescrição é recomendada para pesquisa clínica
A decisão da entidade baiana contra a ampliação do uso de cloroquina e hidroxicloroquina e segue uma orientação da Sociedade Brasileira de Infectologia (SBI), que divulgou uma carta aberta na qual faz alertas sobre os riscos de sua utilização.
“Os estudos clínicos atuais com cloroquina ou hidroxicloroquina, associada ou não à azitromicina, permitem concluir que tais medicamentos, até o presente momento, não mostraram eficácia no tratamento farmacológico de COVID-19 e não devem ser recomendados de rotina. Por outro lado, alguns estudos mostraram seu potencial malefício, podendo causar alteração cardiológica, verificada no eletrocardiograma (prolongamento do intervalo QT), que está
associada a uma maior chance de arritmias ventriculares, potencialmente fatais”, diz o texto.
“Recomendamos que o uso de cloroquina ou hidroxicloroquina com a finalidade de tratamento da COVID-19 seja feito prioritariamente em pesquisa clínica. Porém, se o médico desejar prescrever as medicações, poderá fazê-lo, sendo recomendado que compartilhe com o paciente a falta da evidência científica de sua eficácia à luz dos conhecimentos atuais e seu potencial risco de dano, principalmente cardíaco, e com a assinatura de um termo de consentimento”, enfatiza o documento.